1 de junho de 2012

Texto sobre Mitologia e sua aplicabilidade no cotidiano

     “Dizem que o que todos procuramos é um sentido para a vida. Não penso que seja assim. Penso que, o que estamos procurando é uma experiência de estarmos vivos, de modo que nossas experiências de vida, no plano puramente físico, tenham ressonância no interior do nosso ser e da nossa realidade mais íntima, de modo que realmente sintamos o enlevo de estarmos vivos.”  Joseph Campbell em entrevistas com Bill Moyers

Por que os MITOS?
Para Campbell, um de nossos problemas, hoje em dia, é que não estamos familiarizados com a literatura do espírito. Estamos interessados nas notícias do dia e nos problemas do momento. Antigamente, o campus de uma universidade era uma espécie de área hermeticamente fechada, onde as notícias do dia não se chocavam com a atenção que você dedicava à vida interior. Quando um dia você ficar velho e, tendo as necessidades imediatas todas atendidas, então se voltar para a vida interior, aí, se você não souber onde está ou o que é esse centro, você vai sofrer.
A literatura grega e latina e a Bíblia costumavam fazer parte da educação de modo geral. Contudo, tendo sido suprimidas, toda uma tradição de informação mitológica se perdeu. Muitas histórias se conservavam de hábito, na mente das pessoas.
Quando a história está em sua mente, você percebe sua relevância para com aquilo que está acontecendo em sua vida. Isso lhe fornece perspectiva e de certa maneira, um conforto emocional e psíquico. Com a perda dessa tradição oral, perdemos também essa capacidade de nos espelharmos nas grandes histórias e de traçarmos pontos que nos conectem com algo maior, algo espiritual e significativo. Esses bocados de informação, provenientes dos tempos antigos, que têm a ver com os temas que sempre deram sustentação à vida humana, que construíram civilizações e ajudaram a criar religiões através dos séculos, os mitos têm a ver com os profundos problemas interiores, com os profundos mistérios, e quando o sujeito está excluído dessa realidade não sabendo o que querem  dizer os sinais ao longo do caminho, terá de produzi-los por sua conta.  
Na teoria junguiana, os mitos podem ser considerados a forma, a imagem dada aos complexos e aos arquétipos. Nesse sentido, Stein (1998), afirma que a personalidade de um indivíduo é composta por diversas subpersonalidades, indo dessa forma de encontro com a ideia de unidade psíquica. E, nesse sentido, o autor afirma que “somos feitos de muitas atitudes e orientações potencialmente divergentes, as quais podem facilmente cair em oposição recíproca e criar conflitos que culminam em estilos neuróticos de personalidade” (STEIN, 1998, p. 97). Tais atitudes e orientações são os denominados complexos, conceito desenvolvido por Jung para descrever como o inconsciente pessoal manifesta as suas tonalidades emocionais, as quais constituem a intimidade pessoal da vida anímica (JUNG, vol. 9/1, 2003). Para Jung, os complexos podem se manifestar de forma autônoma e/ou possessiva e, portanto, quando o complexo do ego percebe que há a invasão iminente de outro complexo, este se torna mais rígido, aumentando assim a sua postura unilateral. Por conseguinte, o complexo que está invadindo o ego se manifestará de forma mais complexada (JUNG, vol. 9/2, 1988). Em seu texto “Sobre os arquétipos do inconsciente coletivo”, Jung (vol. 9/1, 2003) esclarece que a camada mais profunda do inconsciente é o inconsciente coletivo, formado por pensamentos arcaicos e míticos. Sustenta que tais estruturas, denominadas arquétipos, são universais aos seres humanos, no sentido de todos os seres humanos as terem presente em sua constituição. É através da interação dos arquétipos com o mundo que criamos os complexos e, com estes, podemos compreender melhor como o psiquismo de um paciente, de um profissional ou de uma criaça se constitui. É importante ressaltar que, durante toda a obra junguiana, o autor valorizou o aspecto dialético do psiquismo humano, ou seja, a permanente tensão entre contrários (entre forças/impulsos/complexos psíquicas contrárias), de maneira que não se pode falar de um conceito separado do todo. Jung sempre enfatizou o processo simultâneo das manifestações psíquicas, ou seja, em sua teoria  é descabido falar sobre arquétipos separados dos complexos, assim como  é também impraticável falar sobre o complexo da sombra sem levar em consideração o complexo da persona (JUNG, vol. 9/2, 1988).
A forma pela qual os complexos se manifestam é a projeção, conceito muito caro à teoria analítica, pois se diferencia de maneira fundamental da teoria psicanalítica. Para Jung (vol. 7/2, 2004), a projeção não é um mecanismo de defesa, mas sim a única forma de expressão do inconsciente. Ele (inconsciente) se projeta em acontecimentos/coisas externas e, por meio dessa projeção, temos acesso à interioridade do paciente. Dessa maneira, a mitologia grega pode ser considerada uma forma de projeção do homem ocidental, que descreveu e categorizou muitos complexos por ele observada. Já López-Pedraza (2010) pontua que a mitologia grega clássica é a forma central  da vida religiosa do homem grego e que os personagens míticos são imagens arquetípicas mitológicas muito particulares, representantes de uma tradição cultural e de uma religião. Para tanto, os mitos são expressões genuínas de uma psique coletiva, que integra o homem dentro de um espaço, tempo e realidade.
Os mitos, afirma Hillman (1995), acontecem no discurso e são vividos na forma em que falamos e imaginamos. Por exemplo, a literalidade do mito de Édipo tomada pela Psicanálise, onde Laio e Édipo se assustaram com a profecia e a tomaram de forma concreta, desse modo, Freud foi capturado por uma versão literal do mito. Nesse sentido, Freud também caiu no literalismo oracular que levou e sucumbiu à tragédia.

“Se Édipo é o nosso mito, os analistas nunca terão suficiente cautela em relação a ler os sonhos como predições e aconselhar ações a partir deles. Exatamente quando nos sentimos no caminho de clarear enigmas, podemos estar indo rumo à tragédia. (...) A psicanálise caminha por sua própria sombra e perpetua a sombra de seu mito trágico.” (HILLMAN, 1995, p. 100)

Rosa Maria Carollo Blanco afirma que para Kérényi o mito é simultaneamente criação e criador do homem ocidental. Segundo o autor (apud Blanco):
“Porque mito, como forma narrativa, é aquela que desperta ecos no narrador e no ouvinte. O que caracteriza a narrativa mítica é que aqui, as suas pessoas dramáticas não se limitam a representar o drama mas, elas o constroem realmente. As pessoas dramáticas são escolhidas e, simultaneamente, se impõem. Uma traz outra depois de si e a história – por sua própria vontade -   passa a existir; ao narrador só cabe completá-la. E a completação, durante o tempo todo é condicionada pelos personagens e pelo seu comportamento intencional.” (Kérényi, 1993 a 98, p 21 apud. Blanco)

Referências Bibliográficas






Queridos!
O workshop foi uma delícia e as contribuições de todos foram muito interessantes e excepcionais!
Estamos sempre abertas a novas sugestões e à disposição para esclarecer dúvidas sobre a teoria!

Possivelmente, um próximo workshop trará a temática do MUNDO DOS NOSSOS SONHOS!

15 de novembro de 2011

8 de novembro de 2011

Crises psicológicas



São Paulo, terça-feira, 08 de novembro de 2011

VLADIMIR SAFATLE

A verdadeira crise

E se, para além da crise econômica, política e ambiental que parece atualmente ser um fantasma a assombrar as sociedades capitalistas, outra crise estivesse à espreita? 
Uma crise ainda mais brutal, dotada da força de abalar os fundamentos da normatividade existente. Lembremos como Max Weber mostrou que o advento do capitalismo trazia, necessariamente, a constituição de uma forma de vida marcada por um modo específico de relação aos desejos e ao trabalho.
Tal forma de vida, cuja face mais visível era a ética protestante do trabalho, baseava-se em um modo de articular autonomia como autogoverno, unidade coerente das condutas e da liberdade como capacidade d e afastar-se dos impulsos naturais. Ou seja, ela trazia no seu bojo a criação da noção moderna de indivíduo. 
Mas, e se estivéssemos hoje às voltas com uma profunda crise psicológica advinda do colapso dessa noção tão central para as sociedades capitalistas modernas?
Uma crise psicológica significa aumento insuportável do sofrimento psíquico devido à desestruturação de nossas categorias de ação e de orientação do desejo.
O sociólogo Alain Ehrenberg havia cunhado uma articulação consistente entre a atual epidemia de depressão e um certo "cansaço de ser si mesmo".
Por sua vez, boa parte dos transtornos psíquicos mais comuns (como os transtornos de personalidade narcísica e de personalidade borderline) são, na verdade, as marcas da impossibilidade dos limites da personalidade individual darem conta de nossas expectativas de experiência.
É possível que, longe de serem meros desvios patológicos, estes sejam alguns exemplo s de uma crise em nossos modelos de conduta que crescerá cada vez mais.
Conhecemos um momento histórico no qual uma crise psicológica dessa natureza ocorreu. Momento marcado pela retomada do ceticismo e de um desespero tão bem retratado nos quadros do pintor Hieronymus Bosch.
Ele só foi superado por processos históricos, fundamentais para o aparecimento da individualidade moderna, nomeados, não por acaso, de Renascimento e de Reforma.
Tais palavras nos lembram que algo estava irremediavelmente morto e desgastado. Algo precisava renascer e ser reformado.
Talvez estejamos entrando em uma outra longa era de crise psicológica onde veremos nossos ideais de individualidade e de identidade morrerem ou, ao menos, algo fundamental de tais ideais morrer.
O problema é que, algumas vezes, a morte dura muito tempo. Algumas vezes, precisamos de acontecimentos que ocorrem duas vezes para, enfim, terminarmos de morrer.

VLADIMIR SAFATLE escreve às terças-feiras na Folha de São Paulo.

4 de novembro de 2011

A arte de criar

(Paulo Leminski)
o barro
toma a forma
que você quiser

você nem sabe
estar fazendo apenas
o que o barro quer


O uso de recursos expressivos permite a livre comunicação de ideias, emoções e sentimentos, que normalmente estariam restritos à censura no plano verbal e racional. A experiência de grupos interativos, como temos percebido nas vivências dos workshops, sensibilizam os participantes para temas variados, proporcionando maior conscientização e aproximação entre as pessoas, sobretudo quando estimulados pela narração de histórias e mitos.


9 de agosto de 2011

Sobre Mandalas

            A palavra “MANDALA” tem origem sânscrita, uma das línguas faladas na Índia e significa círculo de uma forma geral. Tanto no meio religioso, quanto no meio psicológico a mandala significa “imagens circulares” que podem ser desenhadas, pintadas, formadas plasticamente ou até mesmo dançadas.
            Mandala refere-se a uma figura geométrica em que o círculo está circunscrito em um quadro ou o quadrado em um círculo. Essa figura possui ainda subdivisões, mais ou menos regulares, dividida por quatro ou múltiplos de quatro. Parece irradiada do centro ou se move para dentro dele, dependendo da perspectiva do indivíduo.
            
            Frequentemente as mandalas são construídas em forma de cruz, de estrela, de quadrado ou também na forma de um octógono. Na alquimia, um dos principais temas de interesse de Jung em sua obra, a mandala apresenta-se no motivo da “quadratura circuli”, ou seja, representando a união do sagrado com o humano. É a união dos 4 elementos opostos água, ar, fogo e terra.
            Jung recorre à imagem da mandala para designar uma representação simbólica da Psique, cuja essência nos é desconhecida. Observou que essas imagens são utilizadas para consolidar o mundo interior e para favorecer a meditação profunda.

            Além disso, a mandala é utilizada desde os tempos primitivos, pelos chamãs indígenas da América e aborígenes da Austrália, que ainda nos tempos atuais as gravam e desenham em areia colorida.
            Na tradição budista, tibetana, hinduísta e outras tantas culturas orientais a mandala aparece como instrumento utilizado na meditação e na concentração. 
           Já do outro lado do mundo, as mandalas foram conhecidas no mundo cristão há pouco tempo graças ao interesse pelas tradições religiosa-espirituais e esotéricas sobre o mundo oriental. 

            Jung verificou nos sonhos que as mandalas possuem dupla eficácia: conservar a ordem psíquica, se ela já existe, ou restabelecê-la, quando ela desaparece. Essas imagens podem inclusive aparecer de forma espontânea nos sonhos em situações de crise em sujeitos comuns e em pacientes esquizofrênicos e por isso a organização rígida de uma mandala vem no intuito de tentar organizar um estado interno demasiadamente confuso. Chamamos isso de uma tentativa de auto-cura da natureza.  Dessa maneira, a mandala é um representante do todo instintivo que acompanha o ser humano desde o seu nascimento e pode ser considerada como o arquétipo do Self para alguns teóricos. É algo único, como se fosse algo que já existe a priori.
            No Brasil, uma das pioneiras no estudo de mandalas foi Nise da Silveira. Em seu livro “Imagens do Inconsciente” ela relata uma experiência em um hospital psiquiátrico com pacientes esquizofrênicos. Vale a pena conferir!

Um beijo!